"Quando a chuva chega, ela
não vem sozinha, traz consigo minhas melhores e piores lembranças. Expõe a sensibilidade
de um sentimento e de uma situação que nunca tive, ou vivi. Meus medos e minha
imaginação ficam soltos correndo pelo quarto atrás de mim. Escuto o barulho
dos pingos que caem cada vez com mais força, como se o céu fosse ficando mais
alto, tomando conta das galáxias que não conhecemos. A chuva abre buracos no
chão, nas estátuas dos jardins e por toda a parte que cair. Não sou imune, gostaria, mas procuro não vê-la mais através do vidro da janela,
que fica manchada por conta dos pingos que respingam como se estivessem
procurando alguém.
A chuva deixou de ser
meramente um fenômeno da natureza para se tornar em um símbolo de casais
apaixonados: um filme a dois, um namoro, uma relação apetitosa, um descanso com
mais proximidade entre dois corpos. Mas e depois? Volta a ser como antes, que o
antes também seria o depois. Ela, a chuva, mal educada que é, só avisa no dia
que chega, acontece, faz o que tem de fazer, se despede, e vai embora. No entanto,
sabemos, ela sempre voltará.
Os dias e noites sem água
caindo dos céus são mais longos, por isso são comuns. Eles fazem parte da nossa
rotina. A chuva - mais uma
vez ela - se destaca por ser diferente, lava a alma renovando
nossas energias. Na cidade grande, também serve para limpar a sujeira que há nas
ruas, na fachada dos prédios, mas é uma pena também não lavar os corruptos.
Depois da chuva, o clima
entra em equilíbrio, fica mais harmonioso. Aparecem pássaros de todos os cantos
para se alegrar e acabar com a festa das pequenas mariposas. As flores,
com cores mais alegres, se erguem para agradecer o bem que receberam. As pessoas
saem das “tocas” de onde estavam, parecendo animais com medo de se molharem, para
seguir o caminho: o trabalho, a casa, o mercado, o
hospital, o restaurante...
Depois da chuva nada muda
radicalmente. Continuo a ver ela a cair do céu, passando pelo ar poluído por
carros parados no transito e motor ligado, com o som das buzinadas cada vez
mais altas, como se só houvesse um indivíduo atrapalhando a passagem dos demais
querendo chegar logo em casa, pois estar dirigindo em ritmo de lesma há mais
de uma hora.
Passe chuva, passe sol; dia
ou noite, a minha janela verá mais coisas do que eu; sentirá mais do que eu; verá
mais pessoas. Terá mais companhia e ainda não vai ser julgada, a não ser pela chuva
que quer entrar em meu quarto para me perseguir, assim como fazem meus
pensamentos e meus tormentos."
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